De repente um grupo de amigos encontra um esqueleto, que vira mentor e confidente. De repente um sexo casual se transforma em um dilema, que termina em mágoa e silêncio. De repente a juventude perde o prazo de validade e o que sobra, depois dos fogos de artifício, é pólvora queimada: porra, quem é que eles estão tentando enganar? Quem é que, no seu próprio egoísmo, no seu próprio mundo invertido, abre mão de ser alguém no olhar do outro?
Sim, sim, sim, há certa crueldade aí, como diz uma das personagens, um inverno da desesperança onde Márcio Matos quer se afogar, e ele se afoga, escancarando uma Salvador que a gente finge não existir – porque aceitar seria reconhecer o quão abandonados nós somos. Na terra da alegria, vemos então a capital baiana úmida, pegajosa, dolorida, com sombras sujas por todos os lados, como se o papa do axé fosse Schopenhauer e não Bell Marques. É, como diz outro personagem, “corrosão pura, a mesma que deixa Salvador em permanente estado de desmoronamento”.
Aí a ironia do título.
E a dor da vida desperdiçada.
Porque debaixo de todo o escombro, que, além de conter múltiplas vozes narrativas, mistura Los Hermanos com viagens ao Capão, roleta russa, circuito Barra-Ondina e um sentimento doentio de posse, existe uma vontade desesperada de ser: quem é que, atolado na violência dos seus hormônios, consegue se manter honesto consigo mesmo? Quem é que de fato consegue ser por inteiro e não pela metade? Pois é uma armadilha: desejar a onipotência é, desde o começo, torná-la impossível, e o que temos no trabalho de Matos é justamente o retrato de uma geração cujo futuro aconteceu muito tempo atrás. Quando tomamos consciência da nossa condição de adulto, não é este o maior dos medos?
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