A Editora Via Litterarum – Via entrevista a poeta, escritora e professora Maria de Lourdes Netto Simões, Tica, abordando algumas questões com vistas à compreensão acerca do ato de escrever e sobre a criação literária propriamente dita.
SOBRE O ATO DE ESCREVER
VIA -Como e em que momento ou circunstância se percebeu como LEITOR e que a leitura faria parte de sua vida?
TICA – Não houve um momento. Foi processo. Nasci de uma família de leitores/escritores. E contadores de histórias… Ouvir e Ler eram diversões diárias, desde as histórias dos ancestrais, aos contos de Grimm, livros de Monteiro Lobato….
Depois, ainda adolescente, conheci Henrique, grande leitor e companheiro da vida, com quem tive sempre a cumplicidade da leitura. Assim, por gosto, a leitura sempre fez, e faz parte da minha vida; é companheira inseparável.
VIA – Como e em que momento ou circunstância se percebeu como CRIADOR LITERÁRIO ou AUTOR e que escrever faria parte de sua vida?
TICA – Não sei precisar um momento. Ainda menina sempre escrevi as minhas emoções e escrevia as historinhas das aventuras que vivenciava… Depois, viajeira, escrevi relatos de todas as viagens que fiz.
Mas a produção publicada é muito mais ensaística, resultante da minha permanente pesquisa em literatura, cultura e turismo.
VIA -Hoje, em termos de ocupação do tempo dedicado ao trabalho, qual o espaço ocupado pela literatura?
TICA – É dedicação diária… Mas não tenho uma rotina obrigatória para a literatura; escrevo ao sabor dos momentos…. É trabalho e é prazer.
Muitas vezes, é catarse… conversa com os pensamentos… forma de driblar saudade …
VIA -Alguns autores escrevem como uma necessidade existencial. Se fosse possível resumir a motivação principal do porquê escreve, qual seria?
TICA – A produção autoficcional e poética escrevo por vontade de expressar emoções e guardar a memória das minhas impressões de lugares e gentes, da diversidade cultural observada nos vários convívios com culturas pelo mundo afora…
Os ensaios são resultado da pesquisa que desenvolvo.
VIA -No período de um dia, qual seria a rotina enquanto escritor?
TICA – Escrevo/leio diariamente, mas sem rotina…
VIA -Como fica a relação entre INSPIRAÇÃO e REELABORAÇÃO DO TEXTO ESCRITO na sua criação literária?
TICA – A poética e a autoficcional são observação, sensibilização e memória . O reelaborar é muito mais para enxugamento do texto, sempre atenta às ideias de leveza, rapidez, consistência….E, claro, rememoração…
SOBRE A CRIAÇÃO LITERÁRIA
VIA -Seguramente, todo escritor é antes um leitor. Enquanto leitor, qual autor (ou autores) e qual obra (ou obras) considera mais relevante para ser o escritor que é?
TICA – Há os ficcionistas e os teóricos. Difícil resumir… dos ficcionistas: Érico Veríssimo -O Tempo e o Vento; Graciliano Ramos – Vidas Secas; Hemingway -o Velho e o Mar; Gabriel Garcia Marques- 100 Anos de Solidão, principalmente….
E Camões, Fernando Pessoa, Florbela Espanca, Eça de Queirós, Miguel Torga, Almeida Faria … são constantes na minha vida profissional e pessoal…
Dos teóricos, implicaria fazer uma reflexão das tendências teóricas percorridas, desde o estruturalismo, estética da recepção, estudos culturais, questões de comunicabilidade…. Tzvetan Todorov, Greimas, Roland Barthes, Robert Jauss, Umberto Eco, Italo Calvino… e mais…
VIA -Da primeira publicação até hoje, quantas obras possui?
TICA – Em autoficção publiquei somente um livro. Os outros 17 livros são ensaios científicos; fora isso, muitos artigos, em revistas e antologias.
VIA -Qual obra considera a principal?
TICA – hummm… cada livro tem a sua história.
A obra literária está inédita; somente publiquei a autoficção Casinha-que-anda, em uma aventura inesquecível, que foi premiado pela Funart.
Dos ensaios, considero o Pluralidades – patrimônio cultural e viagem.
VIA -Em qual gênero literário se situaria a parte principal de sua criação literária e que experiências possui em relação aos outros gêneros literários?
TICA – Principal para quem? Em relação ao fluxo produtivo? à divulgação?
Dos gêneros literários, a poesia/prosa poética é constante, mas escrevo como catarse; não publico…
A autoficção, escrevo ao sabor das viagens que faço.
Então, em relação à experiência dessa expressão literária, com o Casinha que Anda desenvolvo um projeto de extensão com jovens leitores, objetivando o inventivo à leitura; essa experiência tem me trazido muita alegria.
Mas, como já disse antes, a minha principal produção publicada é ensaística. As experiências nessa área são ligadas à pesquisa e às discussões por ela suscitadas.
VIA -Quando escreve ficção, ao iniciar, a narrativa está praticamente pronta ou essa tem vida própria, surpreendendo o próprio autor, só se conhecendo o enredo e o fecho no próprio processo de criação?
TICA – Os relatos de viagem fluem com a memória de emoções e experiências vivenciadas no caminho percorrido.
VIA -Como vê a literatura em tempos de Internet, redes digitais, ChatGPT e outros aplicativos de Inteligência Artificial?
TICA – Vejo a internet e suas ferramentas como elementos que enriquecem as possibilidades criativas inerentes à arte literária. As redes digitais, vejo com otimismo; considero que ampliam a relação escritor-leitor.
Quanto ao chat GPT, acredito que é necessário cuidado no seu uso para que ele não tome a voz do autor.
VIA -Qual o maior problema para a poesia e a ficção, em uma palavra, para a literatura hoje?
TICA – A distribuição do livro.
Além disso, os apelos midiáticos excessivos, por vezes, criam o desinteresse do leitor para o livro.
VIA -Em qual(ou quais) projeto(s) literário(s) está se dedicando no momento?
TICA – Sobre projetos literários, tenho me dedicado a rever e reescrever os meus tantos, muitos, relatos de viagem inéditos .